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DISCURSO DE POSSE DO NOVO DIRETOR DO INPE

por INPE
Publicado: Dez 12, 2005
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São José dos Campos-SP, 12 de dezembro de 2005

Imagem DISCURSO DE POSSE DO NOVO DIRETOR DO INPE

Gilberto Câmara
09/12/2005

Minhas senhoras e meus senhores:

Permitam-me uma breve memória pessoal. Em 20 de julho de 1969, um garoto de 13 anos assistiu à transmissão ao vivo da chegada do homem à Lua. O espaço surgia como desafio para aquele jovem. Uma cena do filme "2001: Uma odisséia no espaço" completou sua conversão. Quando o chefe dos macacos joga seu osso para os céus e este se transforma numa nave espacial, a imagem do poder transformador do conhecimento colou-se na mente do garoto para sempre. E instintivamente, ele compreendeu o que diz Eric Hobsbawn: "O maior desafio da História é explicar como em cinco mil anos, o homem saiu das cavernas e chegou ao espaço".

 Mal sabia aquele jovem que outros brasileiros também sonhavam o mesmo sonho. E eram tão ousados que, anos antes, em 03 de agosto de 1961, haviam criado um instituto cuja missão era a de construir um Brasil espacial. Qual nova escola de Sagres, este instituto significava antes de tudo a ousadia de pioneiros que se recusavam a ter um Brasil como nação de segunda classe.

 Para o difícil começo, o primeiro diretor do INPE, Fernando de Mendonça, escolheu a rota mais sólida. Dotou o INPE de uma equipe de cientistas e engenheiros de alto nível, com forte componente de Ciência Espacial, cujo compromisso com a qualidade e a excelência continua a ser a marca do INPE até hoje. Um marco foi a criação dos cursos de pós-graduação do INPE, decisão visionária, pois até hoje a pós-graduação é um dos esteios de nossa excelência. A visão dos pioneiros incluiu a implantação de sistema de recepção e geração de imagens de sensoriamento remoto em 1973. Estas imagens, hoje recuperadas e disponíveis na Internet, testemunham as três últimas décadas no Brasil.

Esta base permitiu que, em 1989, o governo pudesse criar a  Missão Espacial Completa Brasileira (MECB), na gestão de Nelson de Jesus Parada. De operadores de tecnologia estrangeiros passaríamos a ser construtores de veículos espaciais. Neste período, também foi estabelecido o programa de desenvolvimento de tecnologia nacional de processamento de imagens e geoinformação.

A partir de 1985, na gestão de Marco Antônio Raupp, o INPE deu três passos ousados: estabeleceu o programa sino-brasileiro de satélites de recursos terrestres (CBERS), criou o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) e inaugurou o LIT (Laboratório de Integração e Testes). As bases do INPE do século 21 estavam lançadas.

Na gestão de Marcio Barbosa, tivemos uma consolidação dos desafios anteriores: lançamos os dois primeiros satélites da MECB (SCD-1 e SCD-2) e o primeiro CBERS. Inauguramos o CPTEC, trazendo a previsão numérica do tempo para o País. Iniciamos ainda a atividade sistemática de monitoramento ambiental da Amazônia, com o cálculo anual das taxas de desmatamento.

Na gestão de meus antecessores, Luiz Carlos Miranda e Leonel Perondi, da qual tenho orgulho de ter participado, foram estabelecidas as bases de uma nova relação entre o INPE e a sociedade brasileira. O lançamento do CBERS-2 e a disponibilidade gratuita de seus dados resultaram em mais de 150.000  imagens distribuídas. O novo supercomputador do CPTEC permitiu a melhoria de nossas previsões, com a inserção do INPE no cotidiano dos brasileiros, através das previsões nos telejornais. O DETER (Sistema de detecção de desmatamento em tempo real) tornou-se um instrumento chave no programa governamental de combate ao desmatamento. A nova política industrial promoveu uma relação equilibrada entre o INPE e a indústria aeroespacial.

Hoje, assumo a direção do INPE, ainda tão sonhador quanto antigamente, mas consciente de seu duplo dever de ser guardião das virtudes do passado e de ser portador do futuro. Encontro um INPE que é uma instituição singular. No Brasil, muitos grupos acadêmicos seguem o princípio da excelência e várias instituições públicas têm a capacidade de mobilização. No entanto, a combinação de excelência com mobilização é extremamente difícil de encontrar no Brasil e torna o INPE um lugar diferenciado. 

Também ouso dizer que existe uma base comum de convicções aos que fazem o INPE. E quais são nossas crenças?

· Acreditamos que vivemos numa economia do conhecimento, onde a principal diferença é entre o saber e o não-saber.

· Acreditamos que a Ciência e a Tecnologia hoje determinam o limite da prosperidade futura das nações.

· Acreditamos que o Brasil pode e deve ter um programa espacial na medida da sua grandeza.

· Acreditamos que o programa espacial é fonte de prosperidade, quando cria empregos de alta competência no Brasil e gera produtos de importância para a sociedade.

· Acreditamos que a Ciência pode ser ensinada, mas a tecnologia só pode ser aprendida. E para aprender tecnologia, precisamos muito de uma indústria capacitada e destemida.

· Acreditamos ainda que a qualidade de nosso trabalho é o único valor que permanece a longo prazo.

· Acreditamos que uma instituição de excelência só pode existir com equipes qualificadas e devidamente remuneradas.

Com base nestas crenças, o que nos reserva o futuro?

Nas áreas de Previsão de Tempo e Observação da Terra, o grande desafio é que o INPE torne-se um centro de excelência em Ciência do Sistema Terrestre, para entender as rápidas mudanças que afetam nosso planeta e o Brasil. Esta nova ciência combina o conhecimento dos sistemas físicos com o entendimento das motivações das ações humanas.

 Na Engenharia Espacial, temos três grandes desafios. O primeiro é manter o programa CBERS dentro dos cronogramas acordados com a China, para que não haja interrupção no fornecimento de imagens que o Brasil tanto precisa. O segundo desafio é completar o ciclo de desenvolvimento tecnológico dos satélites brasileiros. Precisamos dominar as partes cruciais de sistemas inerciais e imageadores de alta capacidade. Para tanto, o programa da plataforma multimissão (PMM) deve completar seu ciclo de projeto e desenvolvimento em 2008. O terceiro desafio é ter uma decisiva participação no projeto do Satélite Geoestacionário Brasileiro (SGB), onde esperamos maximizar a participação da indústria brasileira no projeto e a conseguir que o usemos o poder de compra do Estado para apropriar tecnologias sensíveis.

 Em Sensoriamento Remoto e Geoinformação, precisamos ir além do monitoramento do desmatamento passado. Temos de indicar os cenários futuros de evolução das mudanças do uso da terra no Brasil.  Para isto, o INPE irá ampliar sua contribuição para a rede da Rede de Modelagem Ambiental da Amazônia (GEOMA), feliz iniciativa do MCT para ampliar nossa capacidade de entender o ambiente amazônico.

Na Ciência Espacial, o projeto e lançamento dos satélites EQUARS (monitoramento da atmosfera equatorial) e MIRAX (medida de emissões de raios-X no universo) irão ampliar nossa competência científica e integrar nossos cientistas de Geofísica Espacial e Astrofísica  ao programa de satélites brasileiros.

 Todas estas novas atividades se somam à continuidade dos programas que o INPE já executa. Além de pesquisa e pós-graduação, temos os serviços operacionais de previsão de tempo, geração de imagens, controle de satélites e integração e testes. A manutenção desses serviços é essencial para assegurar à sociedade o retorno dos investimentos que o País faz no programa espacial. Além disso, para que estes serviços sejam bem executados, é importante que estejam numa instituição com credibilidade, respeito, equipes e orçamento adequados.

 Mas a grande contribuição do INPE vai além de tudo isso. Nosso maior produto é intangível. Trata-se de mostrar ao Brasil e ao mundo que é possível criar e manter uma instituição de excelência numa área de tecnologia de ponta em nosso País. Mais ainda, trata-se de fazer isto numa instituição pública do Estado brasileiro. Num país tão carente e desigual, o INPE é um dos símbolos do que podemos alcançar quando a utopia coletiva triunfa sobre o imediatismo.

 Temos a enorme satisfação de saber que nossos planos contam com o integral apoio do governo do presidente Lula, do ministro Sergio Rezende, e do presidente da AEB, Sergio Gaudenzi, e do secretário Avílio Franco. Mais que qualquer plano, o que nos move é a certeza de que somos portadores de um sonho coletivo. Como diz o presidente da AEB, "o programa espacial é uma missão de longo prazo do Estado brasileiro." Estamos de pleno acordo. Temos a consciência de estar construindo algo que será importante para os nossos netos.

 Devo dizer que em minha trajetória tenho tido muito mais sorte que juízo. Nestes 25 anos de INPE, sou afortunado por ter trabalhado com colegas como Antonio Miguel, Ricardo Cartaxo e toda a equipe da Divisão de Processamento de Imagens, e João Vianei, Dalton Valeriano, Jose Epiphanio, Evlyn Novo e toda a equipe da Divisão de Sensoriamento Remoto. Minha fortuna também é ter um trio de mulheres sem par como suporte: minha mãe, Rita, minha esposa Vera Lúcia e minha filha Anita.

 Em nome dos pioneiros que fundaram o INPE, dos criaram um centro de excelência internacional em Ciência Espacial, dos que construíram uma estação na então remota Cuiabá, dos que enfrentaram as intempéries para conhecer melhor o Brasil, dos que tiraram do chão um moderno centro de previsão do tempo, dos que viraram noites no LIT para concluir ensaios de satélite, dos que enfrentaram a epidemia da SARS em Beijing para não atrasar o CBERS, em nome de todos estes e muitos mais, nos é dada a esperança de melhorar ainda mais o INPE.

Devemos ir sempre à frente, carregando a tradição, inspirados no poeta T.S Eloit: "O tempo presente e o tempo passado estão ambos talvez contidos no tempo futuro, e o tempo futuro contido no tempo passado."  Assim, tenho agradecimentos especiais hoje vão para meus antecessores na direção e meus colegas de INPE, a quem tanto devemos. Não tenho outra escolha do que seguir o mote de Saint-Exupery, "Nossa tarefa não é antever o futuro, mas sim construi-lo".  E também o saber do cangaceiro Corisco, que dizia "o futuro fica em cima do futuro, e não embaixo do passado". 

Que o futuro seja de todos nós!


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